terça-feira, 21 de abril de 2015

Carta ao juiz Sérgio Moro


Sinto que, se não escrever hoje, certamente, não terei mais condições de fazê-lo, pois esse sempre quis ser um texto para homenageá-lo. E digo isso porque, a cada dia, menos argumentos encontro na minha consciência para sustentar a imagem de super-herói que, excepcionalmente,  criei de Vossa Excelência.

Excepcionalmente porque, como adulto, nunca acreditei em super-heróis, muito menos salvadores da pátria, pois, afinal de contas, vivemos em um país onde o maior índice de assaltantes por metro quadrado do mundo encontra-se justamente no nosso Congresso Nacional; que tem um Judiciário maculado por figuras como o Juiz Federal Flávio Roberto de Souza (que se apossou dos bens de Eike Batista), o ex-Juiz Federal João Carlos da Rocha Mattos (já condenado por vendas milionárias de sentenças e, agora flagrado em conta na Suíça com saldo de 60 milhões de reais), e quando a nação assiste atônita ao 1º aniversário de um debochado pedido de vistas a imprescindível processo com votação já praticamente decidida no STF, só para citar os casos que estão na mídia esta semana; um país onde o Executivo está historicamente atrelado a gangues partidárias ávidas por ministérios e seus recursos que serão desviados em licitações com cartas marcadas; um país dominado por uma mídia elitista, tendenciosa, sonegadora e desonesta, acostumada a ditar a agenda dos Executivo, Judiciário e Legislativo e que, com elogios de primeira página, cerimônias para entrega de troféus e chamadas bajuladoras nos telejornais, valida o “alvará” que perpetua privilégios não mais em voga nos países civilizados.
Há um ano, quase ninguém conhecia o Juiz Sérgio Moro; hoje, praticamente, o mundo inteiro já ouviu esse nome sempre atrelado a atitudes próprias de um paladino da moralidade ou do herói que enfrenta destemidamente os poderosos; sempre cercado de jovens Procuradores da República e arrojados Delegados da Polícia Federal. Passou, então, Vossa Excelência a comandar a “nova cena” da moralidade que a maioria dos brasileiros tanto aguardava. Sem dúvida alguma, desenhava-se, nas feições de gladiador romano das raríssimas fotos encontradas no Google, a imagem do nosso “super-herói”. 

Hoje as fotos já são inúmeras, daqui a um ano, milhares. Mas, a figura do super-herói transitava apenas no nosso imaginário. Não deveria nunca ter sido levada a sério por Vossa Excelência. E eu acreditei tanto…

E como era bom, adulto, voltar a acreditar em super-heróis. Eu que sempre votei no PT para presidente do Brasil, vi finalmente em Vossa Excelência o homem com poder para peitar velhas raposas da nossa política, com coragem bastante para enfrentar tantas poderosas “forças ocultas”; o Juiz determinado a varrer pra cadeia a sujeira entulhada nos gabinetes mais prestigiados; o comandante de uma equipe aguerrida que produzia a cada dia uma nova blitz espetacular, em reluzentes e velozes carros pretos com brasões dourados, arrastando para trás das grades uma cambada de granfinos desonestos. Repetia eu no Facebook: “Não ficará pedra sobre pedra” A mídia que leio alertava todos os dias sobre o possível equívoco de uma politização nas investigações e, não há como negar, esse fantasma, infelizmente, começou a tomar corpo a cada novo dia.

Embora a briosa obstinação de Vossa Excelência    já se arrastasse por anos, a mídia abutre apoderou-se dela, em questão de dias, e transformou-a em sua própria esperança, salvadora de todos os seus próprios males, deixando consigo apenas o brilho reluzente próprio dos super-heróis salvadores da pátria O comando agora, de fato, passara para a mídia sonegadora e desonesta, acostumada a enterrar e ressuscitar reputações. O que era só fantasma virou bicho, atende pelo nome de  ”politização” e, irremediavelmente, deixará marcas nas investigações.

Não vou questionar aspectos técnicos porque não me cabe, mas, explique Excelência:

1. Por que a citação do nome de Aécio Neves, pelo bandido Youssef, ainda antes do primeiro turno das eleições do ano passado não vazou para a imprensa, e o de Dilma vazou? Acredito que o vazamento não teve a participação de Vossa Excelência, mas por que não tratou de reparar o prejuízo à candidatura de Dilma Rousseff?

2. Por que o escândalo de Furnas, onde Aécio Neves foi citado pelo mesmo Youssef desde o ano passado, não pôde ser investigado por seus comandados; e o rombo no Sindicato dos Bancários que foi presidido por Vaccari Neto há 10 anos pôde?

3. Por que só a família Vaccari foi conduzida, coercitivamente, de forma humilhante, à presença de Vossa Excelência apenas para depor, sem que houvesse algum indicativo de que se recusaria a fazê-lo, caso fosse oficialmente convocada? 
4. Por que só são libertados os que descambam, “espontaneamente”, para a delação premiada, de dedo em riste na direção “certa”? 
5. Será mesmo que após todos esses anos vasculhando os porões por onde transitam, preferencialmente, a burguesia representada pelos que estão nas listas do HSBC, os sonegadores que detêm o poder sobre os meios de comunicação, e os que se elegem através das práticas criminosas comuns a todas as campanhas políticas desde sempre, Vossa Excelência chegou à conclusão de que é mesmo o PT o responsável por tudo isso que está aí?… Que tudo começou com o PT?…

Que o PT inventou o “mensalão” antes do PSDB bem como a prática de suborno em 95% das licitações públicas em TODOS os Órgãos de TODAS as esferas públicas? Permita-me registrar que se engana Vossa Excelência se acredita que a militância petista, os trabalhadores mais humildes do Brasil, a maior parte da classe artística e os pensadores mais sensíveis não querem ver, definitivamente, este País passado a limpo de verdade. Que se engana também Vossa Excelência se acredita que os que foram às ruas no dia 15 de março e 12 de abril são os que querem uma limpeza geral, uma reforma política de verdade e os culpados não petistas atrás das grades.

Cheguei a publicar, no Facebook algumas vezes, que acreditava na seriedade de Vossa Excelência e no seu empenho pessoal para não permitir que tudo se transformasse num nauseante Circo dos Horrores, onde os “monstros” já estão todos dedurados e marcados, aguardando a melhor hora de serem chamados ao picadeiro para deleite da elite empoleirada em áreas nobres e armada de panelas Tramontina, e júbilo da mídia, à beira da falência, que tem diariamente ao seu dispor manchetes as mais variadas, mas todas elas carimbadas com o “talvez”… O “talvez” que destrói irremediavelmente biografias, vidas, famílias.

Ouço gritos de horror… Por isso tinha que escrever hoje, coincidentemente, quando voltei a não acreditar em super-heróis.

Rodolfo J. C. Vasconcellos, Funcionário Público Federal SIAPE – 1671147

domingo, 19 de abril de 2015

Por que Moro faz mal ao país

Paulo Nogueira, no Diário do Centro do Mundo 16/04/2015

Se Moro fosse um produto lançado recentemente, e não um juiz, caberia para ele a 
seguinte palavra: flopou.
Moro flopou.
Flopar, como sabemos todos, vem de flop, fracasso em inglês.
Pois é. Moro fracassou. Fracassou miseravelmente.
A maior de todas as razões é que ele acabou trazendo ainda mais divisão a um país que já 
estava suficientemente dividido antes que ele saísse da obscuridade paranaense em que vivia 
e trabalhava.
Como Joaquim Barbosa antes dele, Moro é hoje idolatrado pelos conservadores e detestado 
pelos progressistas.
A culpa é dele ou das circunstâncias? — você poderia perguntar.
Claro que as circunstâncias favorecem. Você tem hoje um Brasil parecido, sob certos 
aspectos, com a Venezuela – visceralmente dividido.
Mas Moro com certeza deu sua contribuição pessoal. Ele jamais emprestou à Lava Jato uma 
coloração apartidária, assim como Joaquim Barbosa e o STF, um pouco atrás, para o 
Mensalão.
Mais uma vez, fica a sensação que o principal alvo não é exatamente a corrupção, mas o PT 
e o governo Dilma.
E disso resulta a percepção, entre tantos brasileiros, de uma justiça injusta, simbolizada há 
algum tempo em JB e agora em Moro.
Os desvios de conduta da Lava Jato se manifestaram, ao longo da campanha eleitoral, em 
vazamentos descaradamente construídos para minar Dilma.
Só agora, muito depois das eleições, é que se soube, por exemplo, que o doleiro Youssef 
citou Aécio e sua irmã no jamais investigado Caso Furnas.
Imagine o impacto que isso teria nas urnas.
Aécio foi poupado dos vazamentos, como em tantas outras coisas, ao passo que Dilma foi 
massacrada.
Que Aécio ainda assim tenha sido derrotado mostra a sua fragilidade como candidato, e a 
deterioração de seu partido.
Moro jamais se pronunciou contra os vazamentos, ou tomou alguma atitude que 
demonstrasse seu desagrado.
Especulo aqui que seu comportamento seria provavelmente outro se vazassem coisas sobre 
Aécio.
Passadas as eleições, Moro cometeu uma monumental tolice ao aceitar um prêmio da Globo 
e subir ao palco, num contentamento provinciano, com João Roberto Marinho.
Justiça e imprensa não podem se misturar. Não em circunstâncias normais, e menos ainda 
no quadro vivido pelo país.
Você jamais vê na Inglaterra, para pegar apenas um exemplo, um juiz confraternizando 
com Murdoch. É ruim para a imagem de ambos, e a sociedade simplesmente não tolera 
esse tipo de associação.
Agora, a discutível prisão do tesoureiro do PT — no mesmo dia em que a esquerda marcara 
protestos contra a terceirização – lança ainda mais sombras sobre a isenção de Moro.
No twitter, uma hashtag que viralizou nesta quinta retrata o que muita gente pensa, e não 
estou falando apenas de petistas.
Ei-la: #ExplicaMoroPorqueSoPT.
O fato é que Sérgio Moro não tem nenhuma explicação razoável para isso.
O país necessita, com urgência, vencer uma divisão que o vai tornando parecido com a 
Venezuela.
Moro veio para dividir ainda mais.
Por isso flopou. Por isso fracassou.
Por isso, também, ele é uma figura que faz mal ao país.

quarta-feira, 15 de abril de 2015

Vaccari preso e Perrella solto

Paulo Nogueira, no Diário do Centro do Mundo 15/04/2015
Tento me situar nas redes sociais em torno do caso de Vaccari, o tesoureiro do PT preso hoje com o habitual alarido pela Polícia Federal em mais um capítulo da Lava Jato.
Digito Vaccari, no Twitter, e dou no jornalista da Globo Jorge Bastos Moreno.
Num espaço de 140 caracteres, que é de um tuíte, Moreno julgou e condenou em rito sumário Vaccari.
E ainda se dispôs a dar uma advertência tonitruante aos petistas. “Quem, no PT, defender o agora réu e presidiário Vaccari merece o desrespeito, a indignação e a infâmia de toda a sociedade!”, escreveu Moreno.
Um detalhe que me chama a atenção é o ponto de exclamação, um recurso típico de redatores com escasso domínio da prosa.
A primeira tentação é dizer: “Calma, Moreno. Você anda lendo muito o Globo. Vai dar tudo certo.”
Mas meu ponto não é este.
No arroubo de Moreno vejo uma característica que nos últimos anos, por uma ação conjunta da Justiça e da imprensa, lamentavelmente parece ter-se incorporado aos brasileiros.
Passou a ser normal você, como Moreno, condenar sem julgamento e sem provas. Essa anomalia, se já existia antes, se manifestou com intensidade no Mensalão — e, agora, é parte do jogo no chamado Petrolão.
O ímpeto condenatório é seletivo, isso precisa ser notado. Vale, especificamente, contra o PT.
Aécio pode fazer o que quiser – construir um aeroporto em terras da família para uso privado, colocar a irmã numa posição em seu governo que permitia a ela alimentar as rádios da família de dinheiro público, ser citado por um delator como dono das propinas oriundas de uma diretoria numa estatal e por aí afora.
Não vai lhe acontecer nada. A amizade que ele cultivou com os coronéis da mídia lhe garante, como certos protetores solares anunciam, blindagem 24 horas por dia.
E então você tem a seguinte situação: para a Justiça brasileira, alguns são mais iguais que os outros.
Numa manifestação de franqueza brutal, um deputado do PSDB acusado de delinquências disse, pouco tempo atrás, que como não era do PT não seria preso.
Até a Folha, dos coronéis Frias, admitiu num editorial que a Justiça é benevolente diante do PSDB.
Mas sigo em minha pesquisa sobre a prisão de Vaccari.
Dou num artigo do Estadão e paro nele, pela contundência do título. “Lava Jato aponta enriquecimento ilícito de Vaccari e familiares”.
Vou ler.
Como as denúncias na Lava Jato sempre giravam em torno de muitos milhões, e às vezes até bilhões, tenho uma expectativa de encontrar cifras expressivas.
O Estadão dá números relativos a uma filha de Vaccari, Nayara, médica.
Entre 2008 e 2013 – seis anos portanto – o patrimônio de Nayara cresceu de 240 mil para “mais de 1 milhão”.
Quem lida com texto sabe que “mais de um milhão” é muito, mas muito pouco mesmo além do milhão.
Falamos em coisa de 660 mil reais de crescimento patrimonial em seis anos. Cerca de 100 mil reais por ano, e não ponho aqui sequer o que Nayara ganharia se simplesmente colocasse os 240 mil reais de então numa aplicação que rendesse bons juros.
Não tenho, evidentemente, detalhes do patrimônio da filha de Vaccari. Mas as quantias que envolvem suas posses são absolutamente miseráveis para o padrão Lava Jato. São migalhas diante de um banquete romano.
Essencialmente, as cifras não fazem sentido.
Quem se dispõe a desviar dinheiro para contas pessoais dificilmente vai por no bolso trocados caso lide com uma enxurrada de milhões.
Desisto de entender o caso, depois de mais algumas horas de pesquisa.
Suspeito que Moro, como Barbosa antes, tenha gostado de ser objeto dos holofotes e das manchetes, e que se empenhe – conscientemente ou não — por dar um caráter de espetáculo para suas ações.
Antes de partir para o assunto, leio um tuíte que faz refletir mais que todas as matérias que encontrei no caminho: “Perrela livre e Vaccari preso.”