José Dirceu e a capa da Folha
Altamiro Borges, 11/10/12
Os jornalões e os "calunistas" das emissoras de televisão, em especial
da Globo, não conseguiram conter a excitação ontem com o resultado do
julgamento midiático no STF, que confirmou a condenação dos líderes
petistas José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares. O mais escancarado,
porém, foi o jornal da famiglia Frias, a Folha - o mesmo que apoiou o
golpe militar de 1964, cedeu as suas peruas para o transporte de presos
políticos e se aliou com o setor "linha dura" dos generais da ditadura. É
como se a Folha tivesse se vingado das forças de esquerda,
principalmente do ex-líder estudantil José Dirceu.
Até o jornalista Aberto Dines, do Observatório da Imprensa, ficou
chocado com a postura raivosa da Folha - que nada tem de jornalística.
"Uma capa histórica na edição de quarta-feira da Folha de S.Paulo. Numa
única edição, aquele que pretende ser 'um jornal a serviço do Brasil'
despencou no abismo da paranoia, da irresponsabilidade e prestou um
enorme desserviço à formação cívica do leitor", afirma o veterano
profissional da área, que não pode ser acusado de inimigo da mídia
golpista. Reproduzo abaixo o seu artigo:
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Folha & Mensalão
O dia em que o jornalão virou tabloide
Por Alberto Dines em 11/10/2012 na edição 715
Uma capa histórica na edição de quarta-feira (10/10) da Folha de S.Paulo. Numa única edição, aquele que pretende ser “um jornal a serviço do Brasil” despencou no abismo da paranoia, da irresponsabilidade e prestou um enorme desserviço à formação cívica do leitor.
A condenação pelo Supremo Tribunal Federal de José Dirceu e da antiga cúpula do PT levou os responsáveis pela edição a perderem o senso de medida e os compromissos dos jornalistas em preservar sua dignidade e a dos personagens que circulam em suas páginas.
Puro hooliganismo: o jornal vilipendiou uma tragédia política, acirrou rancores, transformou um julgamento exemplar num rififi futebolístico, pisoteou os padrões de decência do nosso jornalismo, inclusive a célebre entrevista de Roberto Jefferson à repórter Renata Lo Prette – hoje na GloboNews – que marcou o início do escândalo do mensalão.
Tarefa contínua
Quando Richard Nixon e Fernando Collor foram obrigados a renunciar para não serem escorraçados da Presidência, os jornais que os derrubaram comportaram-se com mais compostura e respeito. Não se bate no adversário caído, isso sabem até os palhaços das artes marciais que a Folha tanto incentiva.
O rosto de José Dirceu deformado pela luz sobre um fundo escuro, tétrico, esticado para ocupar toda a largura da primeira página, acrescido de um título em letras garrafais (“Culpados”), é o escracho em estado puro, sensacionalismo, versão tupiniquim do tabloidismo murdoquiano e do canibalismo político.
A foto havia sido feita três dias antes, já fora publicada, não acrescentava qualquer informação, não escondia o desejo de avacalhar.
A exibição de perversidade da Folha contrasta vivamente com a capa sutil e inteligente do Globo sugerindo o início efetivo da primavera brasiliense: enorme arco-íris sobre a Praça dos Três Poderes, com a estátua da Justiça em primeiro plano.
O Estado de S.Paulo foi fleumático, solene, como convém a essas circunstâncias: título breve (“Supremo condena Dirceu”), foto também de arquivo, mas sem deformações.
Jornalismo é um exercício contínuo de decência – a Folha deveria debruçar-se sobre este tópico na próxima edição do seu Manual de Redação.
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